Trote saudável faz a diferença no curso de Ciências Sociais

Por Augusto Araújo

 

O trote universitário em sido um assunto polêmico há muito tempo. É certo que, pelo menos uma vez por semestre, quando entram novos calouros, se publique alguma história de violência nas universidades. A tradição é datada da Idade Média, quando os novos estudantes tinham suas roupas queimadas e cabelos raspados. Mesmo com o passar de gerações, muitas coisas são parecidas com aquela época.

Visto como agressivo, o trote é muitas vezes banido verbalmente em diversos cursos e universidades. No estado de São Paulo, existe um projeto de Lei (nº 10.454 de 1999) que, em caso de agressão física, moral ou em qualquer dano à pessoa, acarreta a completa proibição desta tradição universitária na instituição.

No entanto, o trote não precisa possuir apenas pontos negativos. Feito de maneira amigável e sadia, serve para unir os novos estudantes com os já experientes do curso. Um nítido exemplo disso é o curso de Ciências Sociais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Com um projeto tranquilo e confortável, os bixos – denominação usualmente dada dos calouros na Rural – se sentem bem com a experiência.

Aluno Igor Pitahy fala sobre trote solidário

Aluno Igor Pitahy fala sobre trote solidário. Foto: Augusto Araújo

Na verdade, a primeira diferença com relação aos outros cursos da instituição foi a extinção desse apelido de bixo para os calouros e bixete para as calouras. De acordo com Igor Pirahy, estudante do segundo período do curso, os novos universitários são chamados de neófitos, cuja definição é algo novo, recém-admitido ou incorporado, o que faz total sentido no contexto.

Segundo Igor, o objetivo dos veteranos do curso não é criar uma hierarquização entre os alunos, pois, em quase todas as modalidades acadêmicas, o trote acaba gerando uma nítida diferença e distância entre os graduandos. O que as Ciências Sociais procuram é gerar um ambiente mais harmônico entre todos, resultando num convívio melhor e mais proveitoso.

Todo semestre, alguns alunos do curso são eleitos para formar a chamada comissão do trote que, diferente das demais, não é uma turma inteira de algum período específico, mas contando com a participação de alunos de qualquer ano. No segundo semestre de 2016, essa comissão comandou a semana de trote, também conhecida por Semana de Integração, na qual, de segunda a sexta, os neófitos passam por diversos programas, que visam aproximar os calouros com os veteranos e com a própria universidade. O planejamento desse semestre ocorreu deste modo:

 

Dia 1 (segunda-feira): Roda de apresentação dos neófitos, com discussão de conscientização sobre o machismo na Universidade Rural;

Dia 2 (terça-feira): A coordenação, junto com alguns professores, teve o primeiro contato com os calouros, para falar sobre assuntos gerais e apresentar o curso;

Dia 3 (quarta-feira): Os neófitos e a comissão foram a duas cidades arrecadar dinheiro para a primeira festa do semestre do curso, o chamado “pedágio”;

Dia 4 (quinta-feira): Primeira festa do curso, a “festa de integração”;

Dia 5 (sexta-feira): Piquenique de Ciências Sociais.

 

Pode existir um pouco de confusão a respeito do dia três, porque o pedágio é uma tradição do trote de qualquer curso, que envolve pintura dos calouros em busca de arrecadação nas ruas, o que pode gerar constrangimento entre os mesmos. Porém, eles tratam esse dia de modo diferente. Para Ciências Sociais, a pintura corporal é opcional e os veteranos também ajudam a arrecadar o dinheiro, podendo até mesmo ser pincelados pelos neófitos.

O fato do trote do curso ser diferenciado das demais modalidades acadêmicas é comprovado pela vice-coordenadora de Ciências Sociais, Flávia Braga, quando diz que “você pode perguntar aos estudantes do curso porque eles não desobedecem esta regra (como fazem os alunos de outros cursos da nossa universidade), mas em minha opinião, isto tem a ver com perfil crítico de nossos estudantes, que não corroboram com atitudes e tradições hierarquizadas entre as pessoas. De toda maneira, tanto por parte da coordenação de curso, quanto do centro acadêmico e dos alunos do curso, sempre há atividades de integração nas primeiras semanas de aula de cada semestre letivo. Acreditamos que esta é a melhor forma de acolher os novos estudantes em nossa universidade”.

O curso é novo, foi criado pela UFRRJ apenas em 2009, mas já é um exemplo a ser seguido. Promover um trote amigável entre os alunos resulta apenas em pontos positivos, possibilitando uma melhor integração e lealdade entre os graduandos.

 

 

Entrevista com Flávia Braga, coordenadora do curso de Ciências Sociais

 

Qual o objetivo do curso?

Apesar da entrada única, temos na verdade dois cursos. Os alunos escolhem a habilitação a partir do terceiro período. O Bacharelado em Ciências Sociais pretende formar pesquisadores na área e a Licenciatura forma profissionais que, além das qualificações para pesquisa, também estão habilitados a dar aula no ensino básico.

 

Qual sua participação na criação e evolução do curso?

Ingressei na UFRRJ em 2010 e o curso já estava criado, fui vice coordenadora do curso de 2012 a 2014 e, agora no ano de 2016, faço parte do NDE do curso e presido a comissão de estágio. Estive envolvida nos procedimentos de reconhecimento do curso junto ao MEC, inclusive nas três visitas de avaliação que recebemos do INEP.

 

Quais são as carências principais do curso?

Todas as que os demais cursos da expansão da UFRRJ têm, isto é, relativas à infraestrutura física. Não temos salas para os laboratórios e grupos de pesquisa do curso. Não temos gabinetes de professores para orientação individualizada, etc., entretanto, o corpo docente do curso é muito ativo e temos conseguido superar as limitações com muita dedicação. Nosso corpo discente também é muito engajado e o resultado deste processo coletivo de engajamento é que tanto a licenciatura quanto o bacharelado receberam nota 4 na avaliação do INEP e os resultados de nossos egressos no Enade são muito bons. Estamos entre os melhores cursos de Ciências Sociais do país.

 

Qual é o total de alunos participantes? Quantos novos alunos entram por semestre?

Atualmente temos 264 matrículas ativas. 40 alunos por semestre

 

Como é o mercado de trabalho destinado a Ciências Sociais?

A maior parte de nossos estudantes opta por fazer a licenciatura, pois nesta habilitação o mercado de trabalho é maior, ao incluir também à docência no ensino médio. Temos muito egressos que já são professores concursados em redes públicas do país e também na rede privada de ensino básico. O cientista social pode trabalhar em diversas funções como pesquisador, professor (do ensino básico e superior), crítico e em assessoria a empresas e entidades públicas. Suas principais áreas de atuação são: elaborar análises sociais para órgãos públicos, empresas privadas, sindicatos, partidos políticos e organizações não-governamentais; elaborar projetos de planejamento urbano e de desenvolvimento para uma região; realizar pesquisas de mercado para empresas e agências publicitárias; produzir análises e pesquisas sobre arte, cultura, política e economia; assessorar politicamente o executivo e o legislativo; etc.

 

O currículo foi reformado recentemente? Se sim, quais as principais diferenças?

Não tivemos reformas ainda. Estamos em processo de discussão de reformulação da licenciatura.

 

Como é o estágio para os estudantes de Ciências Sociais? Existe a possibilidade de estagiar dentro da Rural ou em Seropédica?

O estágio em Ciências Sociais só é obrigatório para a licenciatura. Os alunos fazem estágio em qualquer escola conveniada pela Rural, em geral na rede pública estadual. Alguns estudantes fazem estágio no CTUR, mas a maioria faz nas escolas públicas de Seropédica, Paracambi, Nova Iguaçu, Campo Grande, etc.

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